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Cirurgia de mais de 18 horas retira tumor e dá novo rosto a jovem no Paraná

Má formação de veias dificultava ações cotidianas, como tomar água, comer ou ir à escola. Ela chegou a perder olho direito, parte da boca e do nariz.

“Eu fiz várias cirurgias. Eram três ou quatro ao ano, às vezes até mais. Para ser sincera, eu até perdi as contas”, relata Andressa Cordeiro, de 26 anos.

O motivo para as intervenções era uma má formação das veias do lado direito do rosto da jovem, chamada de hemangioma cavernoso e considerada um tipo de tumor benigno.

Por conta do tumor, Andressa tinha dificuldade para se alimentar, tomar água, ou até mesmo ir à escola. Além disso, ela tinha sangramentos frequentes, dores na região, e chegou a perder o olho direito, parte dos lábios e do nariz.

Porém, uma cirurgia realizada no fim de 2023 deu à jovem um novo rosto e novas perspectivas.

O procedimento foi feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba. A operação envolveu três cirurgiões de especialidades diferentes, levou mais de 18 horas, foi distribuída em diversas etapas e removeu o tumor do rosto de Andressa.

Andressa ainda está se recuperando. Aos poucos, as dificuldades cotidianas e a impossibilidade de frequentar locais públicos passam a fazer parte do passado.

“Sinceramente, os meus planos são recuperar e focar em mim. Ainda tenho algumas cirurgias para fazer, ainda não acabou. Eu tento não pensar e nem colocar muitas expectativas. Já são anos me tratando e fazendo cirurgias, mas espero ter uma vida normal”, afirma a jovem.

O que é um hemangioma?

A condição é uma malformação venosa onde as artérias passam uma pressão maior para as veias. Com isso, há um aumento dos vasos sanguíneos, que se agrupam como em um novelo de lã e causando um tumor benigno.

De origem congênita, ou seja, presente desde o nascimento, o hemangioma pode aparecer em diversas partes do corpo, mas é mais comum no rosto, peito e costas.

O neurorradiologista intervencionista Gelson Luis Koppe, que acompanhou o caso de Andressa, explica que a maioria dos hemangiomas desaparece até os 10 anos de idade. Por conta disso, intervenções e tratamentos passam a ser considerados especialmente a partir dessa faixa etária.

Ainda conforme Koppe, o tumor pode ser capilar, ou seja, estar na camada mais superficial da pele, ou cavernoso, quando afeta camadas mais profundas.

Segundo o Ministério da Saúde, entre janeiro e novembro de 2023, foram realizados 3.518 atendimentos hospitalares e 9.520 atendimentos ambulatoriais em pacientes com hemangioma em todo o Brasil.

Desses, 69 atendimentos hospitalares e 764 dos atendimentos ambulatoriais foram no Paraná.

Imagem mostra como se dá a má formação venal — Foto: Artes RPC/ Gabriel Trinetto Pedrão
Imagem mostra como se dá a má formação venal — Foto: Artes RPC/ Gabriel Trinetto Pedrão

Como foi o diagnóstico

O diagnóstico de Andressa chegou quando ela completou 11 anos. Ela relembra que no início, por conta da pouca idade, não entendia do que se tratava, mas ao longo do tempo o hemangioma passou a afetar o dia a dia dela.

“Me afetou ao ponto de não conseguir ir à escola, pois tinha muita hemorragia. Logo que saí da escola comecei a me isolar, foi um momento bem difícil”, conta.

De acordo com o médico, as mulheres são as principais afetadas pela condição. Um dos principais riscos envolvidos é o sangramento.

“A maioria das outras pacientes que têm caso tão grave quanto o da Andressa estão fadadas ao óbito por hemorragia”, reforça.

Andressa foi diagnosticada aos 11 anos — Foto: Arquivo pessoal
Andressa foi diagnosticada aos 11 anos — Foto: Arquivo pessoal

Ele relembra que começou a tratar Andressa quando ela tinha 14 anos, e que ela quase morreu justamente pelas hemorragias causadas pelo hemangioma.

Até 2023, a jovem passava por procedimentos para minimizar os sangramentos. Porém, a má formação passou a crescer de maneira abrupta e Koppe sentiu que era o momento de uma intervenção mais enfática.

“Marcamos o procedimento, conversamos muito com a família, colocamos todas as possibilidades, os riscos, e ela definiu: ‘Eu quero fazer, não consigo viver com isso”, conta o médico.

Andressa relembra que, apesar da coragem para enfrentar o procedimento, a preparação para a cirurgia foi repleta de apreensão.

“Eu tentava não ficar pensando muito sobre o assunto, pois era uma cirurgia com riscos de morte. Foi bem assustador para mim”, relembra.

Para o neurologista, o aceite de Andressa para enfrentar o procedimento representou a confiança no trabalho da equipe médica e novas possibilidades para o futuro da jovem.

“Para mim, foi muito importante ela optar por esse tratamento em que realmente nós demos uma nova chance de vida para ela. Eu agradeço muito a possibilidade de poder ofertar isso para ela, é realmente reconfortante”, agradece o médico.

Força-tarefa

Segundo Koppe, o caso de Andressa chama atenção pela complexidade. A cirurgia mobilizou três cirurgiões de hospitais diferentes.

“Nós conseguimos pessoas que estavam dispostas a enfrentar esse caso tão complexo. Ela passou por vários outros locais, Paraná, São Paulo, que falaram: ‘Não, não tem nada para fazer’. Então o importante é você encontrar profissionais dispostos a ajudar”, afirma o médico.

Primeiro, conforme o hospital, a equipe liderada por Koppe usou técnicas para interromper o fluxo sanguíneo que alimentava o hemangioma. Isso possibilitou a obstrução das artérias e veias, prevenindo possíveis hemorragias durante os próximos procedimentos.

Cirurgia ocorreu no Hospital Universitário Cajuru — Foto: Divulgação
Cirurgia ocorreu no Hospital Universitário Cajuru — Foto: Divulgação

No dia seguinte, a médica Marja Reksidler, cirurgiã de cabeça e pescoço dos hospitais Erasto Gaertner e Pequeno Príncipe, conduziu a cirurgia de retirada do tumor em si.

Por fim, o cirurgião plástico Alfredo Duarte, do Hospital São Marcelino Champagnat, deu início à reconstrução facial. O hospital explica que, como houve perda de pele, músculos e nervos, foi necessário um transplante de tecido da própria paciente para a região onde estava o tumor.

Para isso, a equipe optou por um pedaço do músculo das costas, para garantir a movimentação facial e a cobertura de pele.

Koppe reforça ainda a importância da equipe de anestesiologia, que acompanhou toda a cirurgia.

“O meu procedimento demorou de quatro a cinco horas, mais dezoito horas de cirurgia. Tem que ter uma equipe de anestesiologia muito bem engrenada. O apoio do próprio hospital, também é fundamental. Não mediu o esforço para que a gente fizesse todo esse tratamento, inclusive com medicações, o hospital cobriu produtos que não são contemplados pelo SUS. Então, sem a cooperação de todos, não teria sido possível”, reforça.

G1/Globo

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