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O que está fazendo o Brasil ter uma inflação menor que a de países desenvolvidos

Por Vandré Kramer, na Gazeta do Povo

Não é só no crescimento do PIB que a economia brasileira deve ter um bom desempenho em comparação com as principais economias do mundo ao fim do ano. Outro indicador com bons resultados é a inflação. O ponto médio das projeções do último relatório Focus, divulgado na última segunda-feira (10), sinaliza para um IPCA de 5,7% neste ano. Enquanto isso, grandes economias da Europa, como Alemanha e Reino Unido, estão com a inflação na casa dos dois dígitos.

Uma série de fatores favoreceu a queda da inflação em 12 meses, que baixou do pico de 12,13% em abril para 7,17% em setembro:

  • corte nas alíquotas do ICMS sobre combustíveis, energia, telecomunicações e transporte público, e desoneração de tributos federais sobre combustíveis;
  • redução no preço dos combustíveis nas refinarias; e
  • menor pressão dos preços de produtos industrializados, devido à normalização das cadeias produtivas.

A grande dúvida, segundo economistas do Bradesco, se dá no ritmo de queda, já que os cenários doméstico e internacional seguem bastante incertos. A projeção para o próximo ano é de uma inflação um pouco menor que a esperada para 2022, mas ainda acima da meta do Banco Central.

A situação no resto do mundo

A inflação ainda está elevada em outras importantes economias mundiais. Analistas da XP destacam, em relatório, que por anos os países desenvolvidos da Europa e os Estados Unidos tinham um “problema” de baixíssimas taxas de inflação, abaixo de suas metas, e, como consequência, baixas taxas de juro.

“No caso da Europa, bancos centrais da região recorreram a uma ferramenta pouco ortodoxa para estimular o crescimento e inflação: taxas de juros negativas. Recentemente, o cenário mudou, e as autoridades monetárias começaram a abandonar essa política para lidar com o problema oposto: preços subindo muito acima das metas”, dizem os analistas Rafael Nobre, Jennie Li e Pietra Guerra.

Os problemas na Europa começaram em 2021, quando a reabertura da economia começou a pressionar as cadeias de suprimentos. Os preços da energia começaram a aumentar devido à demanda elevada e à recuperação da economia. O consumo foi 1,4% maior do que em 2019, segundo a BP Statistical.

“Esta dinâmica de maior demanda em comparação com uma produção ainda reduzida das commodities energéticas começou a servir de vento de cauda para a alta das mesmas e a interferir na alta de custos da União Europeia”, informa o relatório da XP.

O cenário piorou em fevereiro, com a invasão russa na Ucrânia, que provocou forte alta no preço das commodities e complicou o fornecimento de energia – 40% do gás natural que abastece a Europa é proveniente da Rússia. Do início do ano até setembro, o gás ficou 115% mais caro e o petróleo, 22%.

Nobre, Li e Guerra destacam que, agora, a Europa se encontra em uma situação energética delicada: de um lado colocou boa parte de sua matriz energética nas mãos da Rússia; do outro, apostou agressivamente na transição para energias limpas, desligando parte de suas usinas termelétricas e nucleares.

“Atualmente, a população sofre com um forte aumento nas contas de eletricidade, indústrias estão paralisando operações e a forte alta dos preços corrói o poder aquisitivo da população local”, escrevem os analistas da XP. A estimativa da Eurostat, órgão oficial de estatísticas da União Europeia, é de que o preço da energia tenha aumentado 40,8% em um ano, em média.

Outro grupo de despesas que está pesando no bolso dos europeus é alimentação, bebidas alcóolicas e fumo. Juntos, eles tiveram uma alta de 11,8%, puxada pela comida não processada.

Uma prévia estima que a inflação anual na área do euro possa ter chegado a 10% em setembro. As maiores altas estão nos países bálticos – Estônia (24,2%), Letônia (22,4%) e Lituânia (22,5%). Mas a principal economia da região, a Alemanha, também está com inflação em dois dígitos, de 10,9% na prévia acumulada em 12 meses até setembro.

Além desses problemas, o Banco Central Europeu (BCE) está frente a um dilema: adotar uma política contracionista e colocar a economia em uma recessão ou favorecer o crescimento econômico, em detrimento da estabilidade dos preços.

Os analistas da XP observam que o BCE está cada vez mais inclinado para uma política mais contracionista, causando um risco ainda maior para os ativos locais.

Situação um pouco menos complicada vivem os Estados Unidos, onde o pico da inflação já ficou para trás, segundo analistas. Segundo o US Bureau of Labor Statistics, a inflação atingiu 8,3% nos 12 meses encerrados em agosto.

Energia e alimentação continuam pressionando os índices de preços, com alta anual de 23,8% e 11,4%, respectivamente. É a maior inflação para a comida desde maio de 1979.

A tendência é de que os juros na economia americana continuem subindo nos próximos meses, para tentar combater a inflação. A mediana para a taxa dos Fed Funds (referência para as taxas nos EUA) subiu do intervalo entre 3,25% e 3,5% para 4,25% e 4,5% em dezembro. Para o fim de 2023, o ponto médio das projeções passou de 3,75%/4% para 4,5%/4,75%.

“A alta das projeções de juros se dá apesar de fortes revisões para baixo nas projeções para o crescimento do PIB e a elevação moderada das projeções de desemprego e inflação [nos EUA]”, escreve o economista Constantin Jancsó, do Bradesco, em relatório.

As expectativas para a inflação em 2023

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) avalia que com a mudança no ciclo econômico e o aperto na política monetária surtindo efeito, o pico da inflação deve ter acontecido no terceiro trimestre, tendendo a cair ao longo deste trimestre e de 2023 na maioria dos países do G-20. Entretanto, a alta nos preços permanecerá acima das metas dos bancos centrais no próximo ano.

“Os Estados Unidos, que começaram o aperto monetário mais cedo do que a área do euro ou o Reino Unido, devem registram um maior progresso em levar a inflação para mais perto da meta, que é de 2% ao ano”, informa a OCDE.

A entidade reconhece que a recente elevação nos custos da energia e com a alta de juros começando mais tardiamente do que nos Estados Unidos, a inflação permanecerá elevada em boa parte da Europa.

Entre as principais economias emergentes, o cenário é distinto. A inflação se encontra em níveis baixos e estáveis na China. Para o Brasil e o México, a expectativa é que diminuam as pressões à medida que surtam efeito as altas nos juros. Na Argentina e na Turquia, as projeções da OCDE indicam para uma inflação ainda elevada em 2023, porém menor do que em 2022.

GAZETA DO POVO

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