Segundo o Ministério da Saúde, não há nível de exposição que seja conhecido como isento de efeitos nocivos
Na última semana, os copos térmicos da marca Stanley estiveram no centro de uma polêmica nas redes sociais. O debate começou após usuários, principalmente nos Estados Unidos, realizarem testes rápidos que supostamente detectaram a presença de chumbo nos produtos, gerando uma onda de preocupação entre os consumidores.
A fabricante confirma: os copos Stanley têm, de fato, chumbo em sua composição. O metal é utilizado como material de vedação na base do copo, mas, segundo a empresa, um revestimento de aço inoxidável impede o contato direto com o consumidor.
“A Stanley esclarece que não há chumbo em parte alguma da superfície de seus produtos que entre em contato com o consumidor, ou com líquidos e alimentos que estejam sendo consumido”, diz a empresa por meio de nota.
Os copos térmicos da marca possuem paredes duplas e isolamento a vácuo é o que garante a conservação da temperatura de bebidas em seu interior, de acordo com a fabricante. O material de vedação incluiria uma parcela de chumbo em sua composição, “no entanto, uma vez selada, esta área é coberta por uma camada não removível de aço inoxidável, tornando-a inacessível aos consumidores”.
A empresa acrescenta que “na rara ocorrência desta tampa de inox se soltar, devido a algum caso extremo, possivelmente expondo o selante, este continuará sem contato com o conteúdo ou com o usuário”.
Ainda segundo a Stanley, seus produtos cumprem todas as normas regulatórias dos Estados Unidos, e que realiza testes e validações por meio de laboratórios terceirizados credenciados pela FDA (agência de vigilância sanitária americana).
O chumbo é um metal tóxico que pode ser absorvido pelo corpo após a inalação de partículas finas ou vapores, ou após a ingestão de compostos solúveis. Segundo o Ministério da Saúde, não há nível de exposição que seja conhecido como isento de efeitos nocivos.
Segundo o toxicologista e patologista clínico Álvaro Pulchinelli, presidente da SPBC/ML (Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial), se o chumbo estiver isolado do com o consumidor, não há risco. “Para que haja intoxicação, é preciso haver exposição efetiva da pessoa ao chumbo”, afirma.
O especialista acrescenta que o material é muito utilizado na indústria de tintas e vernizes, e na preparação de baterias. “O chumbo é usado em vários processos, e se houver sistema que isole o contato com o ambiente, não há perigo. A bateria de carro, por exemplo, tem chumbo, mas não fica em contato conosco”.
Pulchinelli recomenda cuidado caso o copo térmico tenha algum dano físico, como trincos e rachaduras, que possam expor o seu interior ao contato humano. “Se o copo está íntegro, não sofreu nenhuma queda, ele pode ser utilizado. Não havendo exposição, não há intoxicação”, afirma.
Segundo o médico, as formas mais comuns de intoxicação por chumbo são por ingestão oral ou de forma inalatória.
O metal pesado leva décadas para ser eliminado do organismo, mesmo após a interrupção da exposição. Ele afeta vários sistemas do corpo, como neurológico, cardiovascular, gastrointestinal e hematológico, sendo especialmente prejudicial a crianças pequenas. “Como muitas tintas têm chumbo em sua base, existem muitos casos de intoxicação de crianças que pegaram alguma casquinha e levaram à boca”, diz o profissional.
A absorção pode ser até cinco vezes maior em crianças do que em adultos, de acordo com o CDC (centros de controle e prevenção de doenças do governo americano). Em gestantes, o chumbo pode atravessar a placenta e atingir o cérebro do feto.
Um relatório de 2020 do Unicef, braço da ONU (Organização das Nações Unidas) voltado para a infância, aponta que 800 milhões de crianças ou uma a cada três em todo o mundo têm níveis de chumbo no sangue iguais ou superiores a 5 microgramas por decilitro. Tal índice de contaminação demonstra a necessidade de intervenções globais e regionais, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).
O metal é uma potente neurotoxina e a exposição na infância causa danos irreparáveis. Os maiores riscos são para bebês e crianças menores de 5 anos, podendo provocar deficiências neurológicas, cognitivas e físicas, além de danos à saúde mental, de acordo com o Unicef.
No caso das crianças mais velhas, as consequências da contaminação incluem um risco aumentado de danos renais e doenças cardiovasculares, diz o relatório.
Um estudo publicado em setembro passado na revista científica The Lancet Planetary Health estimou que 5,5 milhões de adultos morreram de doenças cardiovasculares em 2019 devido à exposição ao chumbo.