Cientistas analisam como a bebida pode afetar o humor e a cognição
Durante séculos, o chá foi usado para muito mais do que matar a sede. Em todo o mundo, as pessoas bebem para relaxar, revitalizar e acalmar, e é algo de que precisamos agora mais do que nunca.
No Reino Unido, onde se consomem 100 milhões de xícaras de chá todos os dias, de acordo com o UK Tea Advisory Panel, a bebida continua fazendo parte da psique nacional, apesar da crescente preferência por lattes, expressos e flat whites. O sentimento de que uma xícara de chá restauradora torna tudo melhor ainda é válido.
Com o consumo de chá crescendo em todo o mundo, as Nações Unidas designaram o dia 21 de maio como o Dia Internacional do Chá.
Mesmo nos Estados Unidos, país há muito dominado pelo café, o consumo de chá está crescendo em popularidade, com as pessoas consumindo 0,4 kg por ano, ante 0,36 kg em 2007, segundo as Nações Unidas, com pessoas se afastando de refrigerantes, leite e sucos de frutas.
Os cientistas estão começando a analisar como o chá pode afetar o humor e a cognição. Específicamente, eles estão investigando se os efeitos calmantes são resultados biológico direto dos compostos do chá ou decorrem do contexto em que a bebida é consumida: preparando sua bebida, escolhendo sua xícara favorita e sentando-se para uma breve pausa para respirar. Ou ambos.
O chá-verde e o chá-preto vêm da mesma planta: Camellia sinensis. No entanto, o chá-verde é processado de maneira diferente, resultando em níveis mais altos de alguns dos compostos que os cientistas acreditam ter efeitos positivos em nossa saúde mental.
Impulso cerebral
Verificou-se que beber chá-verde melhora a função cerebral em pessoas saudáveis, disse Stefan Borgwardt, presidente e diretor do Departamento de Psiquiatria e Psicoterapia da Universidade de Lübeck, na Alemanha.
Em um estudo de 2014, ele deu extratos de chá-verde equivalentes a uma a duas xícaras de chá-verde para 12 voluntários saudáveis e tirou imagens de seus cérebros para analisar mudanças na conectividade dentro de certas regiões cerebrais.
“Percebemos um aumento da conectividade nas regiões do cérebro associadas à memória de trabalho”, disse ele por e-mail.
E uma revisão de 2017 de mais de 100 estudos de sua coautoria descobriu que o chá-verde pode afetar o cérebro de três maneiras: pode influenciar sintomas psicopatológicos, como reduzir a ansiedade; na cognição, ao beneficiar a memória e a atenção; e na função cerebral, especificamente na memória.
Essa revisão concluiu que “seria desejável” que mais ocidentais consumissem pelo menos 100 mililitros de chá-verde por dia “para proteger a função neurocognitiva”.
No entanto, Borgwardt alertou que os efeitos não são grandes e as evidências atuais são fornecidas principalmente por estudos de pequena escala.
Compostos diferentes
O que é menos claro é quais compostos encontrados no chá são responsáveis por várias melhorias em nosso poder cerebral e se eles funcionam sozinhos ou juntos.
Os mais importantes são os antioxidantes como o galato de epigalocatequina (EGCG), o mais abundante, seguido da L-teanina, um aminoácido encontrado nas folhas do chá, e da cafeína.
Borgwardt disse que os benefícios provavelmente não são o resultado de apenas um componente, mas estão ligados à presença de cafeína e L-teanina.
Também há sugestões de que o chá pode melhorar os sintomas de depressão, demência e síndrome de Down.
Um estudo, realizado na Coreia do Sul, em 2018, constatou que bebedores frequentes de chá-verde tinham 21% menos chances de desenvolver depressão ao longo da vida do que aqueles que não bebiam. No entanto, por ser um estudo observacional, não foi possível estabelecer causa e efeito, apenas associação.
Borgwardt disse que estudos em animais sugeriram haver mudanças na massa cinzenta do cérebro e, potencialmente, esses efeitos do chá podem ser usados para atingir doenças psiquiátricas como depressão e demência.
Mas ele observou que a pesquisa estava em um estágio muito inicial e que estudos experimentais deveriam ser confirmados por ensaios clínicos maiores antes de tirar qualquer conclusão.
Nenhum dano
O chá também tem alguns benefícios para a nossa saúde física: está associado a uma vida mais longa, reduz a pressão arterial e também pode ter um efeito de queima de gordura.
Gunter Kuhnle, professor associado do Departamento de Ciências Alimentares e Nutricionais da Universidade de Reading, no Reino Unido, pesquisa os benefícios dos flavonoides, encontrados no chá, no cacau e em algumas frutas.
Ele disse que um dos problemas com a avaliação dos benefícios do chá e seus compostos benéficos é que os estudos que relatam os efeitos são frequentemente observacionais, contando com autorrelatos subjetivos e o impacto de como os alimentos são preparados e consumidos.
Precisamos de dados melhores para realmente avaliar os benefícios do chá em nosso bem-estar físico e mental, com muitas diferenças na forma como é consumido em diferentes países, disse Kuhnle.
Ele observou que no Reino Unido o chá é uma bebida típica da classe trabalhadora, enquanto nos Estados Unidos é uma bebida mais comumente associada à classe alta. Portanto, estudos nos Estados Unidos podem mostrar muito mais benefícios, mas isso pode ser devido ao histórico socioeconômico.
No entanto, com exceção dos suplementos de chá-verde, associados a danos no fígado, e do chá fervente, que foi associado ao câncer de esôfago, não há desvantagem real em uma xícara de chá, disse Kuhnle. Como alemão morando no Reino Unido, ele abraçou a tradição.
“Acho que a maioria das pessoas prospera em rituais. É meio reconfortante. Se há algo errado, você precisa de uma xícara de chá.”