O líder do governo na Câmara será ouvido pela CPI da Covid nesta quinta-feira (12)
O Ministério Público Federal no Paraná move ação de improbidade contra o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara, na qual ele é acusado de ter praticado tráfico de influência ilegal em órgãos municipais e estaduais e ter destinado verba pública de emendas parlamentares para favorecer empreendimento imobiliário em que ele teria comissão de 1% dos lotes.
A ex-governadora do Paraná Cida Borghetti (PP-PR), mulher e sócia de Barros no negócio, também é ré sob a acusação de uso de cargo público e de influência política para benefício pessoal e patrimonial.
O líder do governo na Câmara será ouvido pela CPI da Covid nesta quinta-feira (12). O deputado passou a ser alvo da comissão após ter sido citado pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF).
Em depoimento à comissão, Miranda e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo, afirmaram ter comunicado Bolsonaro sobre supostas irregularidades na compra da vacina Covaxin. Ao ouvir o alerta, o presidente teria atribuído o caso a Barros, segundo Miranda.
A investigação do caso do empreendimento imobiliário teve início com base em reportagem do jornal Folha de S.Paulo de fevereiro de 2017 que revelou que Barros comprou metade de um terreno no valor de R$ 56 milhões apesar de ter patrimônio de R$ 1,8 milhão declarado à Justiça eleitoral.
À época, Barros disse à reportagem que fez um empréstimo de R$ 13 milhões de seu sócio na transação, a empresa do setor imobiliário Paysage Marialva Empreendimentos, para bancar a aquisição do imóvel no ano de 2014 em Marialva (PR).
Em 2014, Barros ocupava o cargo de secretário de Indústria e Comércio do Paraná e foi candidato a deputado federal.
Foi eleito e, em 2015, apoiou, por meio de um requerimento, a liberação de R$ 450 milhões de emenda da União para a construção da obra rodoviária Contorno Sul da região metropolitana de Maringá, que fica a 3 km do imóvel.
Essas informações da reportagem levaram o Ministério Público Federal a abrir uma investigação em 2017, a qual resultou na apresentação de ação de improbidade administrativa em novembro de 2019.
A ação está sob segredo de Justiça, mas a Folha de S. Paulo acessou recursos da causa apresentados ao TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª. Região) que trazem os pontos principais do processo.
Por ocasião da reportagem da Folha de S.Paulo de 2017, a assessoria de Barros informou à época que “eles [Barros e Cida] não têm mais participação nas empresas e, por consequência, na compra do terreno”.
Porém a Procuradoria diz que no documento em que a parceria foi desfeita ainda ficou acertado que eles teriam direito a 1% dos lotes caso todas as aprovações governamentais fossem obtidas e o empreendimento, denominado Loteamento Paysage Trebbiano, tivesse êxito.
Segundo a acusação, as condutas ilegais de Barros alcançaram os níveis municipal, estadual e federal.
O Ministério Público afirma que, em fevereiro de 2014, Barros coagiu pessoalmente os membros do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano de Marialva a emitirem parecer favorável à inclusão da área rural destinada ao empreendimento no perímetro urbano do município.
“Ricardo agiu diretamente como ‘promotor do empreendimento’ para a aprovação da Lei Complementar do Município de Marialva nº 216/2014, utilizando ‘métodos pouco ortodoxos’, segundo a acusação.
No âmbito estadual, Barros e Cida teriam atuado para a prática de ilegalidades no licenciamento ambiental do empreendimento junto ao Instituto Ambiental do Paraná e ao Instituto das Águas do Paraná.
Segundo a acusação, sob a influência dos acusados, as autoridades ambientais deixaram de exigir a elaboração de projeto de sistema de tratamento de efluentes para o loteamento.
A Procuradoria diz ainda que houve irregularidades em vistorias e outorgas e que documentos foram retirados e outros adicionados ilegalmente aos procedimentos ambientais.
Outro indício de improbidade decorre do fato de a aprovação ambiental do empreendimento ter ocorrido com rapidez fora do comum, de acordo com o Ministério Público Federal.
Em nível federal, a Procuradoria diz que Barros e Cida se aproveitaram do exercício dos mandatos de deputados no período de 2013 a 2018 para destinar emendas para a obra do Contorno Sul de Maringá, que beneficiaria os participantes do negócio imobiliário.
“Utilizaram-se do capital e prestígio político, para exercerem influência e negociarem com os demais parlamentares pela inclusão da referida obra nas Emendas de Bancada do Paraná durante tal período”, de acordo com a Procuradoria.
Como exemplo da conduta de Barros, o MPF destacou a atuação dele em março de 2015 com um requerimento de destaque para a aprovação integral de uma emenda para a obra, “angariando o apoio de inúmeros congressistas”.
O MPF cita ainda que Barros, na condição de relator geral do projeto de lei orçamentária para 2016, emitiu parecer favorável parcial pela aprovação de emenda que resultou na inclusão do valor de R$ 103 milhões para a obra na previsão de gastos daquele ano.
Segundo dados levantados pela Procuradoria, de 2013 a 2018 a bancada estadual do Paraná conseguiu a aprovação de valores que somados chegam a R$ 385 milhões para a obra rodoviária, mas ela ainda não saiu do papel.
A acusação de improbidade foi distribuída em novembro de 2019 para a 2ª Vara Federal em Maringá.
Ao fazer a análise inicial do caso, o juiz federal de primeira instância Marcos Cesar Romeira Moraes determinou a remessa do caso para a Justiça estadual do Paraná, por entender que não havia indícios de ilegalidade em âmbito federal relacionado à atividade dos acusados como deputados.
Segundo o magistrado, “a suposta vantagem econômica decorrente da valorização imobiliária provocada pelas obras do Contorno Rodoviário sequer foi demonstrada”, e se tivesse ocorrido não beneficiaria apenas a Barros e Cida, “mas a toda a população e empresas atuantes no ramo imobiliário da região, e não se trataria de vantagem ilícita indevida decorrente da atuação parlamentar”.
Assim, o juiz entendeu que “a ação é manifestamente improcedente em relação aos réus no que se refere às condutas imputadas pelo exercício de mandato de deputados federais” afirmou que o pedido do MPF deveria ser indeferido quanto a este ponto.
A Procuradoria recorreu ao TRF-4 contra a medida do juiz, sob argumento de que “basta a aceitação de comissão [de 1% dos lotes] para atingir ou amparar o interesse das empresas por ação decorrente das atribuições parlamentares”.
Em julho, o TRF4, sem entrar no mérito sobre a existência ou não de indícios da improbidade em âmbito federal, determinou que o juiz de primeira instância decida sobre um aspecto técnico da causa, o qual definirá se o processo continuará sob a responsabilidade do Ministério Público Federal ou será repassado para a promotoria estadual do Paraná.
OUTRO LADO
Em nota conjunta, o deputado Ricardo Barros e a ex-governadora do Paraná Cida Borghetti negam a prática de atos de improbidade e dizem que a Justiça reconheceu que suas operações imobiliárias foram legítimas.
“A Justiça Federal, em decisão de dezembro de 2020, considerou manifestamente improcedente a acusação de tráfico de influência e rejeitou ação. O Ministério Público Federal não possui competência sobre os demais temas abordados. Não houve irregularidade alguma e o deputado Ricardo Barros repudia, mais uma vez, o ativismo político do Ministério Público”, segundo a nota.
O deputado também indicou segmento do despacho em que o magistrado diz que a obra foi planejada e é objeto de pleitos há muitos anos antes da atuação deles como parlamentares e da realização do negócio, e “a imputação de que os réus teriam buscado os recursos unicamente com o propósito de obter lucros reflexos com uma possível valorização imobiliária na região do Contorno constitui uma ilação, que não está no âmbito jurídico”.
O empreendimento imobiliário por questões de mercado não teve avanço, “tendo Ricardo Barros se retirado da parceria, inclusive com prejuízos em decorrência do negócio”, de acordo com a nota.
Procurada pela reportagem, a empresa Paysage Marialva Empreendimentos também negou a prática de quaisquer atos ilícitos no empreendimento e lembrou do despacho de primeira instância que afirmou não haver indícios de improbidade em relação a emendas parlamentares.
Quanto ao negócio imobiliário com Barros, a empresa afirma que “no decorrer dos anos, por questões de mercado, não houve o prosseguimento do projeto e, com isso, a saída do negócio pelo Sr. Ricardo Barros, não havendo qualquer pagamento a ele”.
Segundo a Paysage, todos os atos de aprovação do empreendimento nos órgãos municipais e estaduais ocorreram de forma lícita.