Esqueça os anos 80: a década de 2010 foi a verdadeira década perdida. Graças ao biênio desastroso de 2015 e 2016, em que o Produto Interno Bruto (PIB) caiu 7,56%, o período entre 2010 e 2019 foi marcado por um crescimento médio de apenas 1,3%, contra 3,8% da média global.
A crise deixou marcas profundas, das quais o país mal estava se recuperando quando começou a pandemia. Aliás, entre 2020 e 2021, o PIB deverá cair 1%, entre os 4,5% de queda de 2020 e a perspectiva de crescimento de 3,5% em 2021. Em outras palavras, o período entre 2015 e 2016, os últimos anos do governo de Dilma Rousseff (PT), foi pior para a economia do país do que a pandemia.
Em 2015, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caiu 3,55% — o terceiro pior indicador das últimas décadas, depois dos 4,25% de queda de 1981 e os 4,35% de 1990. Em 2016, despencou outros 3,31%. Por três anos, voltou a crescer, mas sempre em torno de pífio 1%.
De acordo com um levantamento do economista Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), na década passada o PIB brasileiro experimentou um crescimento menor do que para 160 dos 196 países avaliados.
“O Brasil passou por uma profunda recessão entre 2015 e 2016, o período com o pior biênio de crescimento econômico dos últimos 120 anos”, escreve o economista. “Após isto, a recuperação no triênio posterior foi lenta e gradual. Ocorreram alguns choques negativos nesses anos, como a greve dos caminhoneiros em 2018; e Brumadinho, crise argentina e incerteza internacional, com a guerra comercial entre EUA e China, em 2019, que tiraram alguns pontos percentuais do crescimento brasileiro. Mas, independentemente desses choques, o crescimento foi bastante fraco”.
Ascensão e queda
Como o Brasil conseguiu se envolver num atoleiro econômico tão grande? O economista, consultor e professor universitário Túlio Marques Júnior responde: “Antes da crise, o Brasil era um paciente de câncer que dava sinais de melhora à base de morfina”. Desde os mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva, diz ele, o país vinha apostando numa fórmula reconhecidamente falha: “Em todo lugar do mundo em que se faz política econômica desenvolvimentista, o resultado é o mesmo. Primeiro o boom, depois uma queda profunda”.
Foi assim, diz ele, com o regime militar, em meados dos anos 70. “A receita que provocou a crise dos anos 80 foi repetida entre 2002 e 2010”, lembra Júnior. “A doutrina desenvolvimentista sempre deixa a economia pior do que estava. Mas cria bolhas de consumo e de endividamento, sendo que uma lei máxima da economia determina que toda dívida uma hora reaparece, com juros e correção”.
Em seu artigo, Marcel Balassiano, do Ibre/FGV, considera que “os fatores domésticos tiveram um peso maior na recessão brasileira do que fatores externos”. De fato, foi um período tumultuado. Ao interromper esquemas de corrupção de grandes construtoras e empresas públicas como a Petrobras, a operação Lava Jato indiretamente paralisou alguns setores estratégicos da economia.
A dificuldade da então presidente da República, Dilma Rousseff, em negociar com o Congresso Nacional, especialmente com o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, gerou um ambiente de insegurança, que reduziu o interesse dos investidores. E a disparada da inflação levou o Banco Central a aumentar os juros, dificultando o acesso ao crédito.
Gestão desastrosa
A gestão do governo federal poderia ter feito a diferença no sentido de mitigar a crise. Não foi o que aconteceu, afirma Túlio Marques Júnior. “O cenário para a crise estava colocado quando aconteceu uma crise nos preços das commodities, em 2014. Bastou esse pequeno empurrão para o país seguir ladeira abaixo. O governo poderia ter reagido, mas preferiu insistir no desenvolvimentismo”. Por quê? “Porque dá dinheiro para grupos políticos e empresários aliados. Basta pensar no impacto que o crescimento artificial da JBS provocou numa vasta cadeia de pecuaristas e açougues locais”.
De acordo com Marcel Balassiano, em previsão publicada em junho de 2020, com relação à resposta de reação das economias à pandemia, o Brasil alcançará a 171ª posição entre 192 países. Túlio Marques Júnior concorda, e acrescenta um dado: “Para cada 1% de aumento no número de desempregados no Brasil, temos 30 mil mortes adicionais por ano. A pandemia provocou uma queda de 3% no percentual de empregados, o que nos levou ao mesmo nível do pico da recessão de 2015 e 2016”, lembra ele.
“A recessão provocada pela pandemia está eliminando 90 mil vidas ao ano, sem perspectivas concretas de melhoria”. Nesse sentido, ainda que o país tecnicamente tenha saído da recessão entre 2017 e 2019, o economista lembra: “De certa forma, a crise de 2015 nunca acabou, nem tem data para acabar”.
Da Gazeta do Povo